No mês de novembro o saldo das Administrações Públicas, em contabilidade pública, chegou inevitavelmente a terreno negativo (-624M€), estando a sua deterioração relacionada, num carácter mais pontual, com a despesa em aquisição de bens e serviços (influenciada pelo pagamento de dívidas de anos anteriores por parte de entidades do SNS), e num carácter mais permanente com as despesas com pessoal, dada a incorporação do efeito dos pagamentos associados ao descongelamento das carreiras, o impacto orçamental das medidas de valorização remuneratória nas Administrações Públicas, e o pagamento integral do subsídio de Natal.
A “boia de salvação” continua a ser o excelente comportamento do setor da Segurança Social e da arrecadação das receitas fiscais (com um crescimento de 5,3%, que permite compensar o imparável aumento da despesa, de 3,3% este mês), ambos assentes na melhoria do mercado de trabalho e no clima económico favorável que Portugal tem atravessado especialmente nos últimos dois anos – mas que se prevê que abrande já em 2019.
A conjugação da evolução da receita e da despesa apresentada este mês continua a permitir, segundo a estimativa do Institute of Public Policy (sensivelmente -0,5%), que o Governo cumpra a meta do défice revista para 2018 no Programa de Estabilidade (-0,7% do PIB), sem necessidade de recurso a medidas extraordinárias.
Com a divulgação dos dados da execução de novembro já é possível ter uma ideia mais correta do comportamento das despesas com pessoal, eliminando-se os problemas de comparabilidade até agora existentes dado o pagamento do subsídio de natal aos funcionários públicos e pensionistas este ano não ser por duodécimos e ser através do pagamento integral em novembro. Desta forma, esta rubrica passou a registar uma variação homóloga positiva de 0,3% no subsetor Estado e 3,3% nos Serviços e Fundos Autónomos – expectável dado o contexto de valorização remuneratória dos funcionários públicos e a incorporação de duas das quatro fases da medida de descongelamento das progressões. Tal leva à estimativa de um desvio superior a 500 milhões, extra o que havia sido orçamentado.
A rubrica de despesas com pessoal tem sido consistentemente suborçamentada nos últimos anos, sendo que o aumento de 3,2% previsto para 2019 não parece ser suficiente para acomodar a continuação do descongelamento das carreiras (e possível derrapagem dadas as atuais reivindicações), cujo impacto líquido está previsto em 274M€. A previsão dos gastos das despesas com pessoal tem de começar a ser melhor acautelada num futuro próximo, até porque cerca de 80% do crescimento do consumo público em 2019 se deve ao aumento desta rubrica, sendo este um aumento relativamente rígido e dificilmente reversível, com um impacto plurianual.
A dívida não financeira dos Hospitais EPE voltou à sua tendência de crescimento, com um aumento de 52M€ face ao mês passado. Em termos homólogos, continua-se a registar uma melhoria significativa, não se podendo, no entanto, esquecer que tal melhoria assenta em regularizações extraordinárias e reforços de capital, não na aplicação de uma melhor estratégia de gestão integrada e de resolução do problema no longo-prazo.
Os objetivos assumidos pelo Governo no OE 2019 de melhorar o acesso a cuidados de saúde, valorizar a saúde pública, e disponibilizar novos serviços nos cuidados de saúde primários não podem estar desassociados de uma melhor gestão da dívida constantemente gerada pelos Hospitais. Só com o decorrer de 2019 é que será possível observar se as propostas sugeridas pela Estrutura de Missão para a Sustentabilidade da Saúde estão ou não efetivamente a ser tidas em consideração e se estão pelo menos a começar a produzir efeitos positivos na eliminação da acumulação de pagamentos em atraso dos Hospitais.
No entanto, fica desde já o aviso proferido por Pedro Pita Barros no blog Momentos económicos…e não só, de que “Como o crescimento dos pagamentos em atraso dos hospitais EPE tem tido um ritmo superior a 40 milhões de euros por mês, a despesa do SNS será certamente superior ao que está a ser previsto (na ausência de atuação que altere esta dinâmica), e o défice do SNS (falta de receitas para cobrir as despesas) será certamente mais elevado. Ou seja, há aqui passos adicionais que têm de ser dados e explicitados.”, reforçando ainda que os mecanismos criados pelo próprio Governo para solucionar a questão dos pagamentos em atraso (ou seja, a Estrutura de Missão) não têm sido levados a sério pelos próprios intervenientes.
À semelhança do ano passado, o saldo da Administração Local (AL) deverá ficar muito aquém do orçamentado, mais de 50% (467M€ versus 997M€). Porém, o ano passado foi marcado por um aumento extraordinário do investimento a nível local, dadas as eleições autárquicas ocorridas em outubro, facto esse que não se verifica este ano: o investimento local está atualmente a diminuir (-1,6%), ao passo que há um ano apresentava uma variação homóloga de 49,7%. O saldo da AL não devia, por isso, apresentar uma discrepância desta magnitude. Parte é explicado pela DGO com base nas “outras despesas correntes”, que registaram um aumento homólogo de 49,7% afetado “por decisões judiciais que originaram pagamentos extraordinários pela Câmara Municipal de Lisboa”.
Relativamente à Administração Regional, destaca-se positivamente o comportamento da Região Autónoma da Madeira, que desde o início do ano de 2018 (e apesar da sua volatilidade) tem apresentado um saldo significativamente mais favorável do que o apresentado em 2017, assente num crescimento da receita fiscal bastante significativo (especialmente no que aos impostos diretos diz respeito).