Análise da execução orçamental de dezembro 2018

A divulgação dos dados da execução orçamental de dezembro permite verificar que as contas em 2018, em contabilidade pública, registaram uma melhoria de 475 milhões de euros face a 2017, o que se consubstancia num saldo de -2.083 milhões. Essa melhoria tem sido assente, desde o início do ano, num crescimento da receita que suplanta o crescimento (nada modesto) da despesa (5,2% versus 4,5% em dezembro) – relembrando que o OE2018 advogava uma política orçamental restritiva.

Estes últimos dados não alteram as previsões do Institute of Public Policy para o défice de 2018 em contabilidade nacional, que se deverá fixar nos -0,5% do PIB. A metodologia seguida para estimar o valor do défice tem uma lógica incremental: a partir de estimativas da execução orçamental final, obtidas relacionando os dados disponíveis da execução orçamental com os padrões históricos das várias rubricas, calculam-se os “desvios” parciais cujo somatório permite prever o desvio do défice em relação à meta oficial. Note-se que a estimativa aqui avançada assenta nos valores de ajustamentos entre contabilidade pública e nacional presentes no OE 2019 – existindo, por vezes, diferenças significativas entre os saldos e no ajustamento entre óticas que se prevê para o mesmo ano nos diferentes Relatórios do OE, e que não apresentam explicações adicionais associadas.

Pela análise do gráfico dos desvios observa-se que o cumprimento da meta do défice (que se previa ser de -0,7% no OE2019 para o ano de 2018), se fica a dever essencialmente ao excelente comportamento dos impostos. A arrecadação de receita fiscal superou as estimativas do Governo, apresentando uma variação de 4,9% (prevendo-se inicialmente um aumento, já de si significativo, de 3,4%) assente no crescimento da atividade económica e do emprego. O desvio positivo de 1.609 milhões de euros associado à arrecadação fiscal permitiu compensar a totalidade dos desvios negativos (referentes às despesas com pessoal, aquisição de bens e serviços, e ao saldo da ARL).

A par dos impostos, é igualmente o comportamento do investimento público que irá permitir alcançar a meta do défice. Em 2018, o investimento público da Administração Central ficou 926 milhões de euros abaixo do prometido no Orçamento. O OE2018 prometida um montante de investimento na ordem dos 3.408 milhões. Uma vez que esta rubrica se tinha fixado nos 2.292 milhões em dezembro de 2017, tal pressuporia um aumento de 49% ao longo do ano de 2018. Tal como referido pelo Diário de Notícias, seria preciso que o investimento tivesse aumentado mil milhões de euros só em dezembro para ser atingida a meta anual. Embora o crescimento médio ao longo de 2018 tenha sido razoável (a uma taxa média de 7,2%), não foi nem de perto, nem de longe, suficiente para cumprir a promessa realizada.

A análise dos desvios no final do ano aparenta ser menos transparente e apresenta um menor escrutínio público do que os valores inicialmente publicitados aquando da divulgação da proposta do Orçamento. Para o Governo, em termos políticos, é mais seguro anunciarem um aumento do investimento no Orçamento (ainda que não o cumpram), do que agora num próximo Orçamento inscreverem somente o montante que estão efetivamente a pensar gastar – o que pressuporia uma variação homóloga negativa significativa pelo menos no primeiro ano em que isso seria realizado.

Negativamente, para além do desvio negativo do saldo da ARL (já abordado na última análise à execução orçamental), destaca-se as despesas com pessoal. O press release do Ministério das Finanças aborda precisamente o aumento desta rubrica, mas não o seu desvio. É certo que o aumento registado é resultado do descongelamento das carreiras, da reposição do valor de outras prestações como as horas extraordinárias, e do aumento do número de efetivos na função pública (ao contrário do desejo manifestado no programa eleitoral do Governo). No entanto, tudo isso só explica o aumento homólogo registado nesta categoria de despesa, não o seu desvio de 583 milhões de euros. Seria importante aprender quais os erros cometidos na estimação de 2018, porque em 2019 ir-se-á observar uma intensificação deste tipo de medidas – para além de se ter de contar com a incorporação do efeito das medidas já aplicadas ao longo de 2018, que continuarão a produzir efeitos no futuro.

Relativamente à dívida não financeira dos Hospitais EPE, parece inacreditável que tenha diminuído novamente fruto de regularizações extraordinárias (de pelo menos mil milhões) que ocorrem convenientemente em dezembro (facto esse ocultado no press release). Mesmo após todas as promessas do Ministro das Finanças e da criação da Estrutura de Missão. De acordo com a DGO, “os pagamentos em atraso dos Hospitais EPE situaram-se em 484 milhões de euros, reduzindo-se 353 milhões de euros face a 2017. Para esta evolução contribuíram as dotações de capital realizadas nos Hospitais EPE, e desembolsadas no decurso de 2018, que foram canalizadas para a amortização da dívida não financeira, com particular destaque no mês de dezembro.

Não se vê os tais efeitos prometidos desde abril nos press releases de que a tendência de redução dos pagamentos em atraso se iria intensificar nos meses seguintes devido à conclusão do processo do reforço de capital, tendo tal efeito sido visível apenas agora em dezembro – persistindo, assim, o problema de criação de dívida pelos Hospitais. E a aparente insuficiência de dotações para o SNS leva a crer que 2019 não vá ser melhor, começando a desvanecer a fé criada com as medidas anunciadas no OE 2019.