Ano novo, vida nova. Mas não no que às contas públicas de 2019 diz respeito. Os últimos dados divulgados da execução orçamental ainda respeitam a novembro, por isso ainda nada está fechado. No entanto, tal já permite ter uma maior clareza dos desvios que se irão efetivamente verificar no “fim do ano”, e afirmar que, caso não surja nenhuma surpresa no último mês, Portugal irá apresentar já em 2019 um excedente orçamental – o primeiro em 45 anos de democracia.
Segundo as estimativas do Institute of Public Policy – que seguem uma metodologia baseada numa lógica incremental, partindo dos dados disponíveis da execução orçamental e dos padrões históricos das diversas rúbricas – em 2019 o Governo de António Costa poderá esperar um excedente orçamental, em contabilidade nacional, de cerca de uma décima, após consideração do efeito do pagamento do subsídio de natal dos pensionistas, que ocorreu apenas em dezembro.

Por ora, o saldo orçamental da economia portuguesa registou uma melhoria de 1.131 milhões, face a novembro de 2018, o que permite alcançar um excedente de 546 milhões. Este excedente é resultado, especialmente, do crescimento da receita (4,5%), que permite suplantar em 1,5 p.p. o crescimento da despesa.
Com a divulgação dos últimos dados da execução, não se alteraram os principais impulsionadores de uma consolidação orçamental superior à esperada. É certo que só apenas no próximo mês será possível analisar com exatidão os desvios orçamentais registados em 2019, mas dificilmente se esperará um comportamento diferente das rubricas com maior impacto absoluto: investimento público, impostos e contribuições sociais – tudo com um desvio positivo, que contribui para a melhoria das contas públicas.

E o que se poderá esperar destas rubricas para o próximo ano? Basicamente o mesmo comportamento registado em 2019, o que, aliado à ausência de grandes medidas orçamentais previstas para 2020 (que pudessem levar a um aumento superior da despesa), faz com que a previsão de “apenas” um excedente orçamental de 0,2% do PIB para 2020 pareça estranho.
Ainda que revista em baixa – e apesar de poder estar ligeiramente otimista –, a perspetiva para 2020 é ainda de crescimento económico (1,9% do PIB), o que irá permitir manter um bom ritmo de arrecadação de receita fiscal e, consequentemente, uma carga fiscal elevada, até porque não se perspetivam medidas para a redução dos impostos. No final do ano de 2019 o desvio deverá ser na ordem dos 600 milhões.
Adicionalmente, perspetiva-se uma descida da taxa de desemprego para 6,1%, o que, aliada à manutenção de níveis de emprego mais elevados, crescimento da atividade económica e aumento dos salários, permite que as contribuições sociais mantenham a sua tendência de crescimento. Por ora, o desvio ascende a 621 milhões, sendo que o aumento de cerca de 10% perspetivado para 2020 não parece ser suficiente para não se registar no fim do ano um novo desvio de “alguns” milhões.
E quanto ao investimento público? A proposta de Orçamento do Estado para 2020 prevê que o investimento da Administração Central, em contabilidade pública, seja de 3.917 milhões. Tal representa um aumento de 2,8% face ao valor orçamentado para 2019. Esse aumento até pode parecer realista de se concretizar – dadas as promessas do Governo de que este ano é que é! No entanto, o que é importante observar é que a estimativa do Governo para o investimento público no final de 2019 é de 2.628 milhões, ou seja, 1.183 milhões abaixo do orçamentado. Utilizando esse valor (2.628 milhões) como referência, porque é efetivamente o valor que se irá sensivelmente registar, tal implica que o Governo, ao referir que a despesa com investimento na Administração Central vai ser de 3.917 milhões, tem a expectativa de conseguir um aumento de 49%! Realista? Não muito. O ano de 2020 vai, assim, seguir a tendência dos anos passados, continuando-se a verificar a não-execução dos valores orçamentados para esta variável, facto já alertado ao longo das nossas rubricas de análise à execução orçamental e, mais detalhadamente, no IPP Policy Brief 12.

Relativamente à dívida não financeira dos Hospitais EPE, mais um mês, mais um aumento, agora de 78 milhões de euros. Desde junho que o montante acumulado tem vindo a aumentar. Para o próximo mês em análise (dezembro) perspetivam-se “boas” notícias: mais uma injeção de capitais para se reduzir os avultados montantes registados (que se fixam atualmente em 813 milhões), para se registarem novos mínimos históricos – que não refletem, porém, qualquer tentativa de uma diminuição mais estruturada desta dívida.
O ano de 2020 será o ano de aposta no setor da saúde (caso tal não fosse já claro, a mensagem de natal do Primeiro-Ministro veio esclarecer qualquer dúvida). Vai ser, assim, um ano interessante de análise desta rubrica. Vai ser possível esclarecer se a intenção do Governo é de apenas “atirar” dinheiro aos Hospitais para poderem colmatar a sua dívida, ou se alguma estratégia de longo-prazo e medidas de melhoria de gestão dos mesmos irão ser implementadas, identificando claramente quais os hospitais com maior dívida em atraso e as soluções em cima da mesa para reverter essa situação, sustentadamente.
