Análise da execução orçamental de julho 2019

Ainda sem exatidão quanto ao valor final que o saldo orçamental irá apresentar em 2019, é com cada vez mais certezas que a meta do défice de -0,2% do PIB irá ser alcançada, sendo até mesmo provável alcançar um saldo orçamental positivo já este ano e não só em 2020, tal como previa o Programa de Estabilidade 2019-2023.

O desvio positivo apresentado pelos impostos tem sido, sem dúvida, o maior contributo para a melhoria da execução orçamental – ainda que seja preciso ter em conta alguns efeitos temporários do impacto dos reembolsos. O crescimento de 6,3% da receita fiscal permitiu o registo de um défice de 445 milhões de euros em contabilidade pública até julho, o que representa uma melhoria de 2.239 milhões face ao ano transato.

Com um saldo orçamental controlado e com a redução do défice a não ser talvez a maior preocupação, com o que se deve então o atual (e futuro) Governo passar a preocupar? A verdade é que não estamos habituados a esta realidade: a última vez que Portugal cruzou – positivamente – a barreira dos 0% relativamente ao saldo orçamental ainda estávamos no Estado Novo. Problemas não faltam, e a disciplina orçamental levada a cabo até agora não pode ir por água abaixo, pois a inexistência de défice é essencial para que a dívida pública diminua e deixemos de ser um dos Estados mais endividados da zona Euro.

Quais são, então, algumas das preocupações mais imediatas? Destacamos três.

Desde logo o facto de a consolidação orçamental não estar assente numa redução da despesa, mas sim num crescimento da receita superior ao da despesa (6,5% versus 1,6% no mês de julho, respetivamente). Tal assenta essencialmente no bom desempenho da economia, refletido no crescimento da atividade económica e emprego, que permite o já referido avultado desvio positivo dos impostos, bem como das contribuições para a Segurança Social (com um desvio positivo que beneficia o saldo em 560 milhões). O potencial problema aqui espelhado surge quando a economia apresentaa fases de estagnação ou até mesmo de contração, que aliado ao aparente crescimento fixo da despesa pública poderá pôr em causa a consolidação até aqui alcançada.

Em segundo lugar, não podia deixar de ser referido o investimento público. Neste mês não podemos falar, de facto, em desinvestimento, mas os valores que têm sido praticados dificilmente podem ser qualificados como investimento: registou-se um aumento homólogo de apenas 0,4% no investimento realizado pela Administração Central (após dois meses de contração)! Esta rubrica já conta com um desvio de 1.318 milhões de euros, que favorece o saldo orçamental, mas que desfavorece a qualidade de vida dos portugueses que não podem usufruir de um nível de serviços públicos equiparável ao aumento da carga fiscal que se tem registado.

Por último, destaca-se a dívida não financeira dos Hospitais EPE. Os pagamentos em atraso dos hospitais públicos sofreram, de facto, uma significativa diminuição face ao ano passado, tal como foi apontado no press release do Ministério das Finanças – mais precisamente 223 milhões. E este ano têm, de facto, sido registados valores mínimos históricos. Porém, o que se pode observar este ano é que, após diminuições dos montantes em dívida incentivados por regularizações extraordinárias, há consecutivamente registo de aumentos. Um exemplo: em junho havia-se registado uma diminuição mensal de 146 milhões de euros devido a injeções de capital. No mês seguinte, face à ausência de regularizações extraordinárias, já se registou um aumento mensal de 70 milhões, o que pressupõe que a raiz do problema da dívida não financeira dos Hospitais EPE não está, de todo, resolvida, não sendo igualmente possível identificar uma estratégica que tencione resolver esta questão no longo-prazo.